DISTRAIR-SE é ir para diante e para trás; perder o fio da ideia; perder-se no acessório. A lâmpada se desvia do tesouro. Quando seguimos uma ideia com a interposição de outras desnecessárias ou opostas, sofremos distrações. Distrair-se é ficar adormecido diante do objeto que devemos considerar. É como a lâmpada que estava sendo dirigida a um tesouro, mas que se desvia para outro ponto antes que possamos possuí-lo e usufruí-lo. É tratar de chegar a um ponto, mas nos perdermos noutra direção, atraídos por outros objetos. É permitir que estímulos inoportunos afastem o centro de atividade da alma do ideal desejado.
Enquanto seguíamos o livro ou a dissertação, corremos atrás de detalhes insignificantes; ou, então, algo ao nosso redor ocupou o centro de nossa consciência e “perdemos o fio”. É preciso reencontrá-lo, voltar ao caminho novamente. Chegaremos ao término, embora mais tarde e com maior cansaço. Em um resumo descritivo, diríamos: Resultado da distração — RD: eficiência decresce; fadiga aumenta. Isto quer dizer que haverá menor eficiência em relação à concentração e maior fadiga. Com isso, é claro, a saúde mental não se beneficia, e não sentiremos satisfação profunda. Isso ocorre porque é necessário recomeçar o período de ajustamento, além de aumentar a atividade espasmódica, provocando maior desgaste e impedindo a serenidade e o rendimento de uma atenção continuada, pacífica e profunda.
Os raios difusos do sol não conseguem atear fogo em um pedaço de pau seco; concentrados, porém, por meio de uma lente, podem produzir um grande incêndio. Do mesmo modo, um estudante que não sabe prestar atenção não progride nem sente satisfação no estudo, parecendo uma nulidade intelectual; no entanto, uma vez que aprenda a concentrar-se, poderá chegar a ser um gênio e causar admiração por sua eficiência.
Com frequência, chegam até nós estudantes, profissionais ou homens de negócio pedindo orientação e remédios para lidar com o fraco rendimento mental e as contínuas distrações.
A Eis um remédio: antes de tudo, é necessário verificar se as distrações geralmente giram em torno de um tema ou polo fixo, pois, neste caso, a causa e o remédio devem ser buscados na vida afetiva. Deve-se descobrir esse polo nos desejos ou temores exagerados que roubam a atenção de modo obsessivo. Este tema será tratado no Capítulo III: “Atenção obsessiva”.
Se não existe tal foco afetivo de atração ou repulsão, mas as distrações vão, como as borboletas, de flor em flor, ou se assemelham a uma fita cinematográfica que reproduz as lembranças do dia, é necessário verificar se essa atenção deficiente é generalizada ou ocorre somente em relação a alguns assuntos ou determinadas matérias. Neste último caso, se o estudante, por exemplo, tem perfeita concentração em certas matérias, mas não em outras, a causa pode ser objetiva, ou seja, o problema pode estar no professor ou no livro, e não depender exclusivamente do estudante, a não ser que tenha medo ou aversão às matérias em questão.
CAUSAS OBJETIVAS DE DISTRAÇÃO
Caminho e fim desconhecidos. Estrada cortada ou piso sem escada. Caminho desagradável e penoso. Caminhar sem descanso.
O conferencista ou o livro tratam de levar-nos ao reino da sabedoria, ao palácio das ciências, mas, às vezes, o caminho ou o método que empregam é deficiente:
1- Caminho e fim desconhecidos: Se desde o início não nos indicam o término de nossa viagem concretamente, ou seja, o tema que vão desenvolver e o método que vão seguir para explicá-lo, facilmente nossa mente divagará. Não saberíamos por onde iríamos. Quando nos convidam a uma excursão, ficamos mais satisfeitos se nos apresentam antecipadamente as atrações do local escolhido e as belezas do percurso. Caso nos percamos, ainda poderíamos chegar lá por nossos próprios meios. O mesmo ocorre com dissertações ou conferências.
Ao começar a leitura de um livro ou artigo, pergunte-se: de que trata? Como o tema é desenvolvido? As respostas geralmente estão no título, subtítulo ou índice. Livros, conferências ou dissertações tornam-se mais fáceis de seguir quanto mais claros e organizados forem os pontos introduzidos.
2- Caminho interrompido ou piso sem escada: Se o tema estiver acima de nossa preparação, ou em sua exposição forem mencionados conceitos necessários, mas desconhecidos, sem explicações suficientes, é natural que a mente abandone o percurso. Quem nos leva de algo conhecido a algo ignorado, sem os devidos esclarecimentos intermediários, é como alguém que tenta nos conduzir a um andar superior, retirando a escada.
Durante nossos estudos, não deixemos lacunas ou partes intermediárias importantes sem compreendê-las bem.
3- Caminho desagradável e tedioso: Se a exposição for monótona e cansativa, sem exemplos práticos ou comparações que a tornem interessante, se não houver variedade, criatividade ou ideias marcantes, facilmente será gerada distração. Além disso, prevenções ou antipatias em relação ao expositor podem estender-se ao conteúdo, dificultando o aprendizado. Sabe-se que onde entra o desgosto, qualquer trabalho se torna mais pesado.
4- Caminhar sem descanso: Para evitar este último obstáculo e não prolongar a tensão de atenção, é importante intercalar subtítulos e esquemas no texto. Segundo o Dr. Arthus, a atenção voluntária, nos adultos, dura no máximo vinte minutos. Após esse período, não se obtém concentração sem esforço ou desgaste.
Por exemplo, quem dirige por uma estrada estreita e sinuosa em alta velocidade deveria, a cada 15 ou 20 minutos, reduzir a tensão, diminuindo a velocidade. Do mesmo modo, ao lidar com explicações difíceis, busque pausas ou alívios, como exemplos e anedotas. Quando lemos algo árido, podemos complementar a leitura procurando imagens ou casos práticos para tornar o aprendizado mais leve e significativo.
Em aulas ou conferências, recomenda-se aliviar a atenção com digressões, comparações ou humor a cada quinze ou vinte minutos, especialmente se o público for formado por crianças ou se tratar de temas abstratos.
CAUSAS SUBJETIVAS DA DISTRAÇÃO
Debilidade orgânica. Vida dissipada. Falta de treinamento. Esgotamento psicológico. Falta de interesse.
Examinadas as causas objetivas da distração, apontamos também as causas subjetivas:
1- Debilidade orgânica: Caso o estudante enfrente problemas como enfermidades, convalescença, carência de vitamina B ou má alimentação, é natural que tenha dificuldade em fixar a atenção. A solução está em fortalecer a saúde, adotar uma alimentação balanceada e combater avitaminoses. Embora existam casos raros de pensadores brilhantes com saúde debilitada, essa não é a regra.
2- Vida dissipada: Quem distribui sua energia em muitos interesses ao longo do dia — esportes, política, vida social, entretenimento — tende a ter dificuldades para concentrar-se, pois esses pensamentos competem por sua atenção mesmo durante atividades mentais.
O grande pensador e escritor, prêmio Nobel, Doutor Alexis Carrel, em seu livro “O homem, este desconhecido”, luta para que, na vida agitada moderna, se formem ilhotas de solidão nas quais os intelectuais possam isolar-se dos demais para concentrar-se em seus estudos. Eis suas palavras:
“A vida moderna se encontra em oposição com a vida do espírito. Os homens de ciência esgotam inutilmente suas forças e perdem boa parte de suas atividades na busca de um retiro para seus estudos. Ainda não se cogitou de formar, em meio à agitação do mundo, ilhotas de solidão, onde a meditação se torne possível. E esta inovação se impõe cada dia de maneira mais imperiosa.”
As grandes empresas norte-americanas, General Motors, General Electric, etc., estão realizando esta sugestão em benefício de seus pesquisadores, erguendo custosos edifícios longe da cidade, rodeados de parques amenos.
Pouco depois, acrescenta Carrel: “É muito difícil que os filhos do mundo moderno gozem das vantagens que oferece a vida interior. Esta vida, segredo verdadeiramente oculto, escondido, desconhecido, incomunicável (‘impartageable’), é considerada por muitos educadores como um pecado. Contudo, continua sendo a fonte de toda originalidade e de todos os grandes empreendimentos. Só ela permite ao indivíduo conservar sua personalidade no meio do vulgo. Assegura-lhe a liberdade de espírito e o equilíbrio do sistema nervoso em meio à desordem do mundo moderno.”
3- Falta de treinamento. Nenhuma das anteriores causas de distração se podia apontar num aluno interno que, apesar de não perder um minuto de estudo, era o último da classe. Julguei que lhe faltava treinamento; chamei-o à parte para estudarmos juntos. Ele costumava ler toda a lição quase sem fixar-se, nem entendê-la. Tornava a ler e reler até poder repeti-la como um papagaio. Expliquei-lhe que, para se aprender alguma coisa, é preciso começar por entendê-la.
Mandei-o ler em voz alta o primeiro parágrafo; tirei-lhe o livro e pedi que fizesse um resumo do que lera; não havia fixado nada na mente. “Vamos ver de novo.” Agora, sabendo que teria que fazer o resumo, teve a atenção comandada pela vontade e repetiu-me uma das ideias principais.
“Escreva esta ideia em uma frase ou em uma palavra que a recorde.” Leu o segundo parágrafo; tirei-lhe o livro e escreveu o segundo resumo; e do mesmo modo o terceiro e o quarto. Afinal, com esses resumos, pôde recitar a lição, mas ainda muito incompleta.
Mandei-o então ler de novo o primeiro parágrafo para ver se faltavam ideias importantes.
— Sim, disse-me alvoroçado, aqui falta uma. — Está adiante ou atrás do que você escreveu? — Adiante. — Então escreva-a adiante. — Aqui há outra, para trás.
Escreveu atrás e foi assim completando o resumo. Ao terminá-lo, recitou-me perfeitamente a lição, com o auxílio dos resumos. Daí a recitá-la sem eles foi uma questão de poucas repetições. A partir de então nunca mais foi o último e terminou felizmente o curso.
Quantos talentos ocultos brilhariam como diamantes se alguém os polisse, ensinando-os a concentrar a atenção! Um dos melhores métodos será formular a si mesmo perguntas sobre a matéria e tratar de encontrar as respostas na leitura; também é bom método ler, lápis em punho, fazendo resumos.
E, a quem me objetasse que assim nunca terminaria sua lição, diria como os romanos: “Festina lente”: indo devagar, chegarás depressa, pois não precisarás de tantas repetições. Custar-te-ão os primeiros ensaios, mas, à medida que o teu talento sintético se for desenvolvendo, fá-lo-ás com rapidez e experimentarás o prazer de possuir muitas verdades em ricas sínteses.
4- Esgotamento Patológico. O “surmenage”, ou estafa cerebral, costuma aparecer por causa da atenção anormal; por exemplo: atenção ao que estudamos e ao problema que nos preocupa; ou por causa de uma atenção prolongada ou sem suficiente descanso; ou por trabalhar habitualmente com pressa e ansiedade, insatisfeitos com o que fazemos e preocupados com o êxito; ou por exigir de nossas faculdades e tempo rendimento maior do que seria razoável.
Chegará o momento em que a dor, peso, calor ou tensão na cabeça ou ao redor das órbitas nos incomodará ou preocupará; agitar-se-ão as ideias tristes e deprimentes; tornar-se-á difícil concentrar a atenção durante meia hora ou ainda menos; sentiremos cansaço.
Então o remédio ideal seria não pensar em nós nem nestas coisas molestas, mas concentrar-nos totalmente, com tranquilidade e alegria, no que fazemos, pois toda sensação de fadiga tende a aumentar ao se pensar nela, e ao contrário diminui e até desaparece quando aplicamos toda nossa atenção, tranquila e alegremente, em outra coisa.
Como, porém, conseguir esse esquecimento de si? No começo ajudará viajar ou mudar de ambiente ou ocupação, ou aprender a descansar através de sensações conscientes e, em seguida, praticar os Exercícios de Concentração que o Dr. Vittoz empregava em Lausanne.
Remédios práticos
Não somente em casos de esgotamento, mas ainda no caso de simples divagação mental, poderiam ser úteis esses exercícios, como nos confessaram muitos que os praticaram conforme os expomos em nosso livro “Controle Cerebral e Emocional”, Cap. III-B. Eis alguns:
a) Concentração visual externa. Se, ao traçar um ponto, penso unicamente nele, terei a concentração de um instante de duração. Se o prolongar em linha reta, sem pensar em outra coisa, conseguirei uma concentração de vários segundos. Com os nervos e músculos sossegados, traçarei no ar com o dedo figuras amplas sem solução de continuidade, procurando segui-las com atenção e naturalidade.
b) Concentração visual interna. Às vezes será conveniente dedicar-se a fazer tais desenhos mentalmente, sem interferência da mão, sobre um tabuleiro imaginário, e exercitar-se assim vários dias.
c) Concentração auditiva. A senhora Z. sentia grande dificuldade em prestar atenção a discursos ou conferências e, quando tentava concentrar-se, ficava tão nervosa e constrangida que várias vezes teve de abandonar a sala. O barulho também a impedia de dormir à noite e, no escritório ou em casa, não podia ler nem escrever quando outros falavam ou tocavam piano perto dela. Exercitou-se durante vários dias em captar voluntariamente diversos ruídos durante o dia, depois em acompanhar o som do relógio dizendo e ouvindo mentalmente “tic-tac” dez vezes, sem distrair-se; no segundo dia chegou a 15 e no quarto a 20 e mais vezes sem pensar em outra coisa. Não empregava neste exercício mais de cinco minutos cada vez, embora o repetisse umas oito vezes por dia. Conseguida esta concentração auditiva bastante satisfatória, pôde passar a prestar atenção voluntariamente a uma leitura ou discurso, primeiro durante dez, depois quinze ou mais minutos, sem medo e sem distrações. Se estas sobrevinham, seu único cuidado era fixar de novo a atenção no que estava sendo dito. Ao fim de um mês, estava curada.
d) Concentração na leitura. Fixar nossa atenção no que lemos até o primeiro ponto. Descansar então alguns instantes com sensações conscientes. Continuar a ler até o segundo ponto e assim até completar uma página, repetindo este exercício até três vezes por dia.
Quando o cansaço sobrevém mais durante uma leitura do que ao escutar uma narração ou discurso, é muito provável que a causa esteja na tensão e nervosismo dos olhos. Veja-se a explicação e remédios no capítulo X, “Olhos ativos e passivos”.
Reverendo Narciso Irala, S. J.
Para aprofundamento: Educa-te: Paideia Cristã
Para aprofundamento: Livro A Mulher Católica: Graça & Beleza (Ana Paula Barros)
Ana Paula Barros
Especialista em Educação Clássica e Neuro Educação pela Pontifícia Universidade Católica. Graduada em Curadoria de Arte e Produção Cultural pela Academia de Belas Artes de São Paulo. Professora independente no Portal Educa-te (desde 2018). Editora-chefe da Revista Salutaris e autora dos livros: Modéstia, Graça & Beleza.