Acerca da decência no vestuário, pelo Abade A. Bayle

by - dezembro 05, 2019


I – Quanto me afliges, Minha filha, quando te vejo de tal modo ocupada pelas festas mundanas, vaidades e modas, que para as seguires em teus vestuários e enfeites, não tem pejo de violar as santas leis da modéstia. Dotou-te Deus de razão para que te percas em semelhantes frivolidades? Em lugar de diligenciares agradar-Lhe, não cuidas senão em ser agradável ao mundo e às criaturas. Como tu correspondes mal, ó Minha filha, às graças que te prodigalizou e aos fins a que se propunha concedendo-as. Para desculpar uma tal desordem, as tuas companheiras, bem o sei, dizem que não querem ser ridículas, escarnecidas pelas outras e olhadas como pessoas cheias de escrúpulos e de preconceitos.


A modéstia não se opôs nunca à decência e à propriedade do vestuário. A negligência e a grosseria nunca agradaram a Deus nem às almas virtuosas; mas é o impudor e a imodéstia que Deus detesta e pune severamente. Quando Eu era da tua idade, também Me enfeitava segundo o Meu estado e a Minha condição, mas para atrair o respeito e a estima de preferência a uma admiração vã, que não serve senão para excitar as más afeições.


Crê tu, Minha filha, que esses ornatos, esses trajes justos e essas nudezas descaradas sejam capazes de te atrair o respeito? Se observasses a modéstia, quem zombaria, de ti? Não seriam as pessoas virtuosas e tementes a Deus, mas as donzelas levianas e mundanas. E tu, inquietar-te-iam as suas tolas irrisões! Deixar-te-ias arrastar à perdição pelos seus maus exemplos! Ah! cora da tua loucura e não te envergonhes de imitar os Meus exemplos, se Me tens amor.


II. – Tu, Minha filha, não podes observar em jejum prescrito pela Igreja; o só nome de mortificação te assusta; o ar que se respira no hospital ou na câmara dum doente revolve-te o coração: mas a que tormentos te não submetes para seguires as leis da vaidade e da moda, para te apertares a fim de pareceres dum talho elegante e gracioso? A que mal-estar, a que escravidão tu te condenas, quantos enojos e enfados suportas, quer seja para dar-te as mais vivas cores, quer ao contrário para fazer empalidecer essa cor e adquirir, como costuma dizer-se, uma cor sentimental? És mártir da moda, ou antes, - do demônio. Quantos trabalhos tu tomas voluntariamente para te condenares, e quanto desgosto experimentas em fazer alguma coisa pelo céu e por tua alma!


Se um confessor te impusesse por penitência dos teus pecados sofrer unicamente a metade do que sofres pelas modas, taxá-lo-ias de indiscreto. Mas tudo se torna fácil quando é o mundo que o ordena. Deus faz mal, dizia um dia um dos Meus fiéis servidores a sua filha, que via diante dum espelho toda aplicada a vaidade; Deus faz mal se te não envia para o inferno, porque tu procuras todos os meios de ir para lá. É, pois assim, ó Minha filha, que desempenhas as promessas feitas no dia sagrado do teu batismo?


Na verdade, tu desonras muito a Minha modéstia, afetando, pela pouca decência no vestuário, querer agradar aos mundanos! Crês tu ter a modéstia duma donzela cristã, quando até para a igreja vais carregada de jóias e modas escandalosas? Quando pela afetação do teu aspecto fazes com que todos os olhares se dirijam mais depressa para ti do que para o altar? Quando roubas para ti mesmo as homenagens devidas a Meu Filho e a Mim, Sua Mãe e tua?


Aviva a tua fé, ó Minha filha, e reconhece que nesse ato um demônio que se apresentasse no lugar santo faria menos horror que tu.


Persuades-te sempre, ó Minha filha, que não fazes senão o que as outras fazem. Ainda que os pecados que tu cometes e fazes cometer pela imodéstia do teu vestuário sejam inumeráveis, fazes deles tão pouco caso, como muitas outras das suas companheiras, que os não confessa ou que te acusas quando muito, de ser um pouco inclinada à vaidade.


Ah! Minha filha, tu não compreendes bem o que quer dizer – ser inclinada à vaidade: não vês os grandes males que dali derivam.


A vaidade produz a glória vã que coloca a sua própria felicidade, não em agradar a Deus, mas em ganhar a estima e afeição dos homens com a esperança de ser por eles aplaudida. Produz a perda do tempo, tesouro tão precioso de que o Espírito Santo nos recomenda estimar a menor parcela: faz passar todos os dias longas horas diante do espelho, que tu não calculas, mas que Deus conta. Produz a ruína nas famílias, o desgosto dos pais que nunca podem satisfazer o teu gosto pelas modas.


Produz o escândalo das tuas irmãs e companheiras, a quem o teu exemplo inspira o gosto das modas e aformoseamentos imodestos; o escândalo também nas estranhas, porque te tornas como um laço de Satanás, e das quais arrasta as almas para o inferno, inflamando-as das chamas impuras. Produz a profanação do lugar santo; faz roubar dum modo sacrílego a honra devida a Deus. Aparecendo na igreja sem modéstia, elevas-te em face do santo altar como um altar profano e detestável, sobre o qual são sacrificados ao demônio da libertinagem os corações e as almas de todos aqueles que o idolatram. Tens tu seguido essas modas vãs e escandalosas?


Oh! se tem sido assim, corrige-te, Minha filha! Desgraçada de ti, se não reparas essas culpas pela penitência.


Afetos. – Tinha os olhos fechados a respeito destas culpas, ó Mãe Santíssima. Não via os graves inconvenientes da vaidade. Agora reconheço que é um laço insidioso que me expõe a perder-me e outros comigo. É preciso, pois que o evite; não posso agradar a Deus, querendo agradar aos homens e a mim mesma.


Querendo parecer amável aos olhos do mundo, tenho-me tornado execrável aos Vossos e aos do meu Deus. Malditas vaidades! Enfeites detestáveis! De hoje avante não tereis mais encantos para mim. Renuncio a isso, ó Mãe compadecentíssima, como renunciei no dia do meu batismo. Faço-Vos de novo a promessa, porque não quero perder a minha alma. Se for desprezada pelo mundo, que me importa contanto que agrade a meu Deus e a Vós? Tendes-me feito conhecer o meu mal e quero sanar. Ajudai-me, Mãe querida.


Com o Vosso socorro não mais serei infiel às promessas que agora faço e para sempre. Fugirei d’ora avante com o maior cuidado à imodéstia e à vaidade.


(Maria falando ao coração da donzela, meditações para todos os dias do mês, traduzido do italiano pelo Abade A. Bayle --Professor de Eloquência Sagrada na Faculdade de Teologia de Aix--; Quinta edição, Livraria Catholica Portuense, ano de 1917)

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