Catequese com Contos Medievais 6: A roda
Acredita-se que as gárgulas eram colocadas nas Catedrais Medievais para indicar que o demônio nunca dormia, exigindo a vigilância contínua das pessoas, mesmo nos locais sagrados. |
CONTO
A roda
São Bernardo voltou certa vez à sua aldeia natal – Fontaine, perto de Dijon – para encontrar junto à lagoa de sua infância toda a calma e toda a força de que necessitava. Com efeito, através de sua eloquência e da força de convicção de sua fé, ele deveria arrastar para a segunda Cruzada tudo quanto na Europa havia de melhor na nobreza e nas classes populares de boa vontade. Por isso ele precisava de um momento de contemplação e repouso em sua terra natal.
Tanto mais quanto havia tempo que inquietações e dúvidas o assaltavam e atormentavam, dando a impressão de que uma diabólica mão pesava-lhe sobre as costas, queimando-a. Uma voz lhe murmurava palavras desencorajadoras e anunciava que seu projeto iria fracassar. Imagens ora tentadoras, ora aterrorizantes desfilavam diante de seus olhos. São Bernardo lutava contra o demônio com todo o poder da oração, sendo nisso ajudado pela tranquilizadora paisagem de seus jovens anos. A serenidade voltou e ele decidiu se reunir com o já numeroso magote de companheiros de fé e de combate, com os quais pegou a estrada de Vézélay.
Os caminhos naqueles tempos eram ruins e
difíceis, as viagens lentas e penosas, o perigo acompanhando os viajantes como
se fosse parte de sua própria bagagem. Entretanto, incidente algum de
importância perturbou o avanço do comboio que se aproximava do ponto de
chegada. Ora, uma tempestade de uma violência extraordinária pegou-os uma noite
num vale muito estreito. Um ruído infernal descia como que rolando de pedra em
pedra, torrentes de lama ameaçavam a todo o momento levar as carruagens, os
bois e os cavalos. Os viajantes encontraram refúgio numa gruta onde acabaram
cedendo ao sono. São Bernardo ficou só sob a tempestade a fim de tranquilizar
os animais. O santo tentou desentalar uma das charretes que estava atolada na lama,
mas enquanto o fazia uma de suas rodas quebrou completamente. Um riso
estridente se fez ouvir nas suas orelhas e ele percebeu nas costas o sopro
ardente que ele conhecia bem. O diabo não abandonava sua presa e naquela noite
mostrava-se mais empedernido. São Bernardo fez então lentamente o Sinal da Cruz
e com voz forte deu ordem ao demônio para ocupar o lugar da roda quebrada.
Uivando de dor e de raiva, o espírito mau não pôde resistir à vontade daquele que agora era seu senhor. Mordendo a própria cauda, ele assumiu a forma circular e tirou com suas forças a charrete entalada. O amanhecer despontou calmo e luminoso sobre o comboio já disposto em ordem e todos retomaram a estrada. Apenas um gemido melancólico proveniente de uma roda ritmava a marcha: esta foi a única lembrança dos furores da noite. No dia seguinte, São Bernardo atingiu o alto da colina de Vézélay e ali pregou a Cruzada com o brilho que a História registrou.
(Fonte: Sophie e Béatrix Leroy
d’Harbonville, “Au rendez-vous de la Légende Bourguignonne”, ed. S.A.E.P.,
Ingersheim 68000, Colmar, França, págs. 59-60)
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