O que realmente é o Vício da Vaidade

by - setembro 28, 2022








"Filho meu, te rogo: vigia, seja sóbrio, para conhecer aqueles que montam armadilhas contra ti. O espírito da maldade e da incredulidade teimam em caminhar juntos; o espírito da mentira e da fraude caminham juntos; o espírito da avareza, da cobiça e o do perjúrio, aquele da desonestidade e o da inveja caminham juntos; o espírito da vaidade e o da voracidade caminham juntos; o espírito da fornicação e o da impureza caminham juntos; o espírito da inimizade e o da tristeza caminham juntos. Desgraçada a pobre alma em que habitarem (estes vícios) e a dominarem! A essa alma, a apartam de Deus, porque ela está em seu poder, vai daqui para ali até que cai no abismo do inferno." (São Pacomio, Padre do Deserto)


Do sete pecados capitais

A lista dos sete pecados capitais foi formalizada no século VI pelo papa Gregório Magno, tendo como base as Epístolas de São Paulo, e foi assumida formalmente pela Igreja no século XIII, com a Suma Teológica de Santo Tomás de Aquino. “Capital” deriva do latim caput, que significa "governo; cabeça; líder"; esse documento explica em quê esses sete pecados diferem dos outros: são como os “líderes” de todos os outros pecados e deles derivam as outras faltas contra Deus.

Historicamente, alguns santos e religiosos da nossa Tradição Católica escreveram e enumeraram aquilo que eles entendiam sobre os Pecados ou Vícios Capitais, o que nem sempre fora o número de sete. Evágrio Pôntico por exemplo, listou uma quantidade de 8 vícios, São João Cassiano também listou 8 vícios mortais, este um pouco diferentes de Evágrio. São João Clímaco também listou aquilo que chamava de sete paixões pecaminosas. Mas foi mesmo por meio do Papa São Gregório Magno, que o número 7 se consolidou. Ainda assim, Santo Tomás de Aquino, apesar de manter o número dos Pecados Capitais em sete, modificou a classificação dos mesmos.

Segundo um sumário retirado do “The Catholic Bible Concordance“, estes são mais ou menos os números com que cada pecado aparece nas Sagradas Escrituras:

– Orgulho = 138
– Avareza = 27
– Inveja = 13
– Ira = 274
– Luxúria = 23
– Gula = 9
– Preguiça = 5


A Vaidade

A Doutrina dos 8 vícios ensinada pelos Padres do Deserto nos apresenta os vícios como 8 demônios. Portanto a Vaidade é uma doença espiritual. Sobre o demônio da vaidade é dito: 

"O pensamento da vaidade é um pensamento muito sutil, que com facilidade infiltra-se estre os virtuosos. Inspira-lhes o desejo de publicar suas lutas e de irem atrás da glória dos homens. Fá-los fantasiar que estão expulsando furiosos demônios, curando as mulheres, que multidões procuram tocar-lhes os mantos. Prediz-lhes que hão de tornar-se sacerdotes, e já fazem o povo vir bater à sua porta em busca de conselho... (o demônio da vaidade) entrega-os ao orgulho e a tristeza... as vezes também a luxúria, eles que um pouco antes pareciam santos" (trecho fragmentado Pratikos, 13 em apostila do curso Formação do Caráter, Doenças Espirituais, Educa-te, aqui).


A vaidade não está no mesmo nível dos outros vícios, segundo São Cassiano em suas Conferências, ela surge quando os outros vícios já foram superados, surge nos virtuosos. Por isso, é uma doença espiritual muito sutil, neutraliza a força para continuar lutando contra os vícios, trabalha até a alma se tornar laxa e cair em pecado ou o virtuoso continua lutando mas, como coloca tudo na bolsa da vaidade ou é motivado por ela, perde a sinceridade de coração. Por isso o Papa Francisco diz que "a vaidade é a "osteoporose" da alma". A vaidade é vanglória.

"A vaidade não é, como a soberba, um desejo desordenado da própria excelência; é um desejo desordenado das honras e dos louvores, ainda quando sabemos que os não merecemos. Os sinais são:

1.° Louvando-nos a nós mesmo: falamos de nós e de tudo o que prevemos, que há de ser-nos proveitoso; divulgamos as nossas boas qualidades e obras, as mais das vezes exagerando-as e mentindo;

2.° Falando da nossa condição, do nosso nascimento, da nossa fortuna, das nossas dignidades: realçamos as menores circunstâncias que podem obter-nos a estima e o louvor;

3.° Elogiando os outros para que nos elogiem também;

4.° Encaminhando a conversação para as obras que julgamos ter feito com perfeição: usamos de rodeios e finura para arrancar alguns louvores; rogamos aos que nos ouvem, que nos digam em que erramos; mostramo-nos descontentes com o que fizemos e até censuramos o que reputamos melhor, a fim de forçar os outros a falar em nosso favor;

5.° Confessando os nossos defeitos, quando não podemos encobri-los para que outros no-los não lancem em rosto; e exageramo-los, para que ao menos digam, que somos humildes." (HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo VI, p. 162-165 disponível em Rumo a Santidade)


Portanto, a vaidade se alimenta dos olhares dos outros, já a soberba se alimenta da visão superior que a pessoa tem de si mesma. 






A era da publicidade


Numa época em que aparecer é sinônimo de existir, falar das facetas da vaidade e seus incontáveis sinais se torna uma tarefa hercúlea. O principal motivador, atualmente, para a vaidade é a percepção de que a validação pública é indispensável, nada de privado é considerado precioso. sendo que a humildade tem raízes na vivência privada, em uma ocultação intencional. A publicidade exacerbada de si mesmo facilita a doença espiritual da vaidade, nos sentido anteriormente relatado. 


"A publicidade é um dos grandes ideais modernos. Quem não aparece, quem não é visto, sofre dessa invisibilidade como se duvidasse de seu próprio existir. Apalpa-se, duvida-se de si mesmo, sente-se desencarnado, alma do outro mundo, e só se tranqüiliza quando os outros, os olhos dos outros, a atenção dos outro, vêm confirmar aquela existência em crise.

A propaganda é um dos aspectos mais repulsivos dessa cultura estridente. A última guerra, como todos sabem, foi uma guerra de propaganda, e só pôde ter a horrível feição que teve, porque os homens perderam o recato.

Vejam por exemplo na política os despudorados esgares da demagogia. Vejam o que se entende hoje por bem-comum. Quando os governantes querem dar boa impressão de seu mandato, o que fazem eles? Obras monumentais. Obras visíveis. Palácios. Estádios. Obeliscos. E mal lhes ocorre, a esses hierofantes do sucesso e da vanglória, que o bem comum é uma coisa obscura que se espalha, que se subdivide pelos homens, que se esconde, para ser verdadeiramente o que é, sob os tetos dos homens." (Gustavo Corção).




A Virtude da Modéstia e da Humildade 


A virtude da modéstia é uma virtude anexa à Virtude Cardeal da Temperança, é uma virtude moral, que portanto, é vivenciada por meio do esforço para tal. A Temperança possui várias outras virtudes anexas. As Virtudes Anexas são mais fáceis de executar que a Virtude Cardeal das quais são precursoras, ou seja, a Virtude Cardeal é o Portal e as virtudes anexas são as pedras seguras do caminho. Nada entendeu do sistema das virtudes, tão detalhadamente explicado por São Tomás, quem acredita que é possível ser temperante sem antes fazer os esforços necessários na aquisição das virtudes anexas. 

As virtudes anexas são: a continência, a clemência, a mansidão e a modéstia.


Ao tratar sobre a Virtude da Modéstia encontramos a beleza da ação das virtudes em nossas almas, como uma atrai as outras, temos também, virtudes anexas à Temperança por influencia da Modéstia. Ou seja, como um amigo que chama outros amigos, a Virtude da Modéstia nos faz crescer em Humildade, Estudiosidade e a Modéstia propriamente dita (comportamento: falar, olhar, vestir, agir). 


Dessa forma, se a cura da Vaidade é a Humildade, temos que buscar a Virtude da Modéstia que nos fará moderados em mente e atos, possuidores de uma visão clara de nós mesmos e de uma consciência clara; pois, com ela recebemos a presença da humildade (visão real de nós mesmos), estudiosidade (que é remédio da curiosidade) e a modéstia própria (que modera o comportamento). 


Vaidade é diferente de estar bem disposta (mas vale ter cuidado)


Atualmente tem se tornado frequente a pauta sobre o auto cuidado e dentro dos meios católicos surgiu o assunto em prol da boa aparência em casa e para os seus. Coisa muito louvável, mas que, a depender da alma, precisa ser munida de alguns cuidados. Para isso cada um deve buscar conhecer suas próprias mazelas e saber até que ponto tal ato é saudável e quando passa a se tornar desornado, um ato travestido de algo para o serviço ao próximo. Como a linha é tênue e cada alma tem suas inclinações, é preciso buscar manter a consciência clara para saber quando algo já se tornou doença espiritual, dependência da aparência ou ainda atrapalha ou limita atividades que possuem valor espiritual maior, como se atrasar para a Santa Missa ou para a realização de um dever. Ou quando o gasto com peças e produtos excede o orçamento ou tomam o lugar de preferencia em relação a livros e cursos, que podem nutrir e educar a mente, a alma e o corpo. 

Nesse ponto vale lembrar a justa medida no uso das coisas, mas, acima de tudo, a devida ordem das coisas, existem coisas e gastos mais preferíveis que outros. Quanto a voracidade, que caminha junto com a vaidade, costuma se manifestar no consumismo desenfreado das coisas, principalmente as não preferíveis. A elegância externa é precedida pela elegância espiritual e esta ocorre quando escolhemos, elegemos, o melhor.  Elegância é preferir o preferível, com esta definição podemos afirmar que o Céu é cheio de pessoas elegantes, ou seja, de pessoas que souberam escolher, eleger, o que é melhor. 

É por isso que São Padre Pio diz que quem busca a vaidade das roupas não conseguirá se revestir de Cristo. A modéstia é buscar ter um comportamento divino, como diz Padre Scheeben, em seu Maravilhas da Graça Divina (aqui): "{Deus} deve igualmente conceder a seus filhos as belas virtudes celestes, correspondentes à sua dignidade, pelas quais hão de conseguir seu destino sobrenatural. Aos filhos de Deus cumpre serem perfeitos como é perfeito o Pai Celeste, terem costumes divinos e reproduzirem a imagem de Deus em cada um de seus atos, em todos os gestos e ações"



Referências (dos livros atualmente disponíveis):

Bíblia Sagrada (aqui)

Pequena Filocalia (aqui)

Modéstia o Caminho da Beleza e da Santa Ordem (aqui)

Maravilhas da Graça Divina (aqui)

The Catholic Bible Concordance for the Revised Standard Version Catholic Edition (aqui)


 



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