Nós não temos a esperteza da serpente, nem a pureza da pomba. A agitação moderna tomou conta dos corações, nos fez esquecer obviedades. Por exemplo: a linha oficial da Igreja.
Eu sei que a linha extra oficial tem um papel absurdamente grande nos dias de hoje. Conseguimos orientar, abrir debates, refletir e estimular, incentivar autores, professores e toda pessoa de boa vontade; é muito útil, mas é uma linha extra oficial. Já lhes contei, muitas vezes por sinal, que o funcionamento da Igreja é monárquico (embora tenha ganhado um ar democrático nos últimos dias, mas é só o "ar") e burocrático. Isso significa que a linha extra oficial tem efeito, mas é um efeito distante do centro da questão: o clero. A linha extra oficial sempre deixa aquela sensação de que não é real, não são pessoas reais que frequentam paróquias reais. Bem, isso é solucionado pela presença na linha oficial de comunicação da Igreja, linha esta que se resume a: cartas. Sim, é assim tão simples e antigo. Cartas de próprio punho de preferência.
Temos muita movimentação na linha extra oficial e nenhuma na oficial. Isso não é inteligente. É bem fácil para os bispos dizerem que nunca receberam nenhuma solicitação, que nunca ninguém os procurou, que nunca lhe pediram nada em relação aos pontos caros para os que amam a Tradição. E de fato, é verdade. São poucos os corajosos que mantém uma ação na linha oficial, com nome, sobrenome e endereço. E isso é um erro crasso.
"Mas eles não nos escutarão", "vão nos perseguir". Bem, eu só tenho uma coisa a lhe dizer: isso está bem dentro da normalidade do Evangelho, portanto crie tipo cristão.
Entretanto, pode não ser assim. E se for, não deveria ser um problema. Usar a linha oficial da Igreja nos permite ter em mãos o testemunho de que foi solicitado reiteradamente, cordialmente e houve (se for o caso) negligência solene e proposital. É uma atitude inteligente que parece ser pouco atrativa para quem só deseja afagos e tapinha nas costas, vivendo um amor pela Tradição em grupos de WhatsApp.
Tal ação deve ser pessoal e ordenada, para isso alguns pontos são importantes:
- as cartas devem ser cordiais e escritas por cada pessoa (nada de ficar se escondendo atrás de um grupo ou pessoa, crie tipo),
- se for só você/família que seja só você, uma alma tem grande valor para Deus e os bispos deveriam pensar o mesmo;
- não é para enviar um diário, é uma solicitação curta, cordial e respeitosa, um pedido;
- as cartas devem ser enviadas com "confirmação de entrega" pelos Correios para a Cúria Diocesana aos cuidados do Bispo Diocesano, assim você tem o nome de quem recebeu e quando;
- os envios devem ser feitos uma ou duas vezes por ano, mesmo se não tiverem resposta (lembre-se que isso é a comprovação da negligência, assim como é a comprovação do cuidado se for respondida e acolhida) a intenção é que a Hierarquia saiba que existem pessoas reais com nome e sobrenome, entre eles, que amam a Tradição e que precisam de cuidados;
- se houver uma reunião, não se esqueça de fazer atas da reunião com assinatura do que foi acordado;
- apesar desses cuidados, busque sempre manter o clima cordial e bem humorado, nada de já se apresentar com o Código de Direito Canônico numa mão e a Suma na outra, não é a intenção;
- cuidado com a linguagem, na maior parte das vezes eles entendem bem quando o amor pela Tradição é apresentado como um carisma, um desejo de conservar as belezas da Igreja; como uma ação do Espírito Santo para proteger a nossa História como fez tantas vezes na História da Igreja.
- cuidado com os pensamentos, cada padre tem no coração uma Chaga feita pelo Senhor Jesus, todo padre têm, inclusive os que não são bons, foi colocada lá no dia do primeiro chamado dele para a vida sacerdotal. É com essa porta para o Coração de Jesus que nós nos propomos a falar. Portanto, pensamentos e comportamentos amáveis. A fala no mesmo tom, os gestos comedidos, sem bajulação nem aspereza. Lutar com destreza e doce harmonia é uma grande forma de lutar.
-nada de infantilidade e imediatismo, as coisas tem o seu tempo, o que importa é a nossa postura, a nossa decisão convicta diante da Hierarquia.
Alguns acreditam que isso é insignificante. Bem, há dez anos este país estava entregue nas mãos dos comuna, totalmente, nós não tínhamos esperanças; hoje surge uma onda enorme em prol da Tradição, dos estudos e etc, veja bem, numa terra que o povo não lê nem gibi. Da mesma forma, historicamente, durante o regime militar os militares deixaram a estrutura das universidades nas mãos dos comuna e olha só no que deu. Deixar, sem nenhuma ação oficial, a estrutura da Igreja nas mãos deles, é a coisa mais burra que podemos fazer, isso não dará certo. A Igreja é uma engrenagem política e social potente, sempre foi a engrenagem mais desejada pelos poderes que sobem e descem na montanha russa mundial. Não dá pra abandonar a engrenagem, a estrutura paróquia - diocese, achando que isso não terá efeitos devastadores ou que nós passaremos incólumes pelos efeitos devastadores. Essa estrutura consegue levantar e decair governos, meus caros, acordem, nós vimos isso com nossos próprios olhos. Pode edificar ou destruir um povo todo. A estrutura da Igreja está atrelada a Hierarquia que Cristo estabeleceu, o que torna bem mais grave a deserção, é como o soldado que abandona o posto de proteção do castelo do Rei. Isso não é aceitável, por não ser inteligente. E tudo que o posto exige é usar a linha oficial, simples e fácil. No topo da Hierarquia está Aquele que tudo sabe e vê. Ele escutou o clamor do povo muitas vezes, escutará mais uma vez. E se a questão é clerical é para lá que devemos fazer a questão se solucionar.
Existe um conto oriental que diz que um Rei tinha em seu castelo um sino, o sino era tocado quando havia injustiça no reino. No entanto, o reino possuía muitos eruditos que eram ministros da justiça, isso significava que se o sino tocasse era porque os ministros estavam negligenciando o dever e o povo caiu em sofrimento. Para tocar o sino a pessoa que queria denunciar deveria passar por 120 chibatadas e só depois tocar o sino. Isso acontecia para que ficasse comprovado que, de fato, era uma injustiça e o denunciador estava comprometido com a justiça e a verdade para além de si. Por isso, o Rei sempre se comovia em zelo pela justiça quando o sino tocava.
Quem terá o compromisso de tocar o sino?