Literato Católico: Gertrud von Le Fort e sua Metafísica e Teologia Mística

by - segunda-feira, janeiro 06, 2025









Ficha de Leitura

Título: A última Cadafalso

Autor(a): Gertrud von le Fort

Ano de Publicação: 1931

Gênero: Novela

Tema: Metafísica e Teologia Mística



Crítica de Cultura (por Professora Ana Paula barros)


Um artigo da Universidade de Chicago diz: "Gertrud von le Fort foi uma proeminente literata católica do século XX, autora de mais de 20 romances, contos e poemas. Seu emprego do realismo sacramental exerceu uma influência significativa, embora muitas vezes inadvertida, mas frequentemente explícita, sobre obras de escritores como O’Connor, Greene, Bernanos e outros.


Le Fort cresceu no norte da Alemanha no final do século XIX. Em 1907, aos 21 anos, visitou Roma pela primeira vez e manteve-se lá por quatro meses, aproximando-se da Igreja Católica e da freira Irmã Marie de Maylis. Contudo, a experiência levou alguns anos para convencer totalmente le Fort a se converter. Sua obra poética magna, "Hinos à Igreja", indicou um movimento definitivo em direção à Igreja Romana em 1924. Ela se converteu ao catolicismo em 1926 e viveu e publicou até 1971, quando faleceu no Dia de Todos os Santos, aos 95 anos."




Em 1931, Gertrud von le Fort publicou a novela Die Letzte am Schafott (A Última ao Cadafalso), baseada na execução em 1794 das Mártires Carmelitas de Compiègne. Uma tradução em inglês, intitulada The Song at the Scaffold, apareceu em 1933. Com base nesta novela, Georges Bernanos escreveu um guião em 1947 para um filme de Philippe Agostini que, contudo, jamais foi filmado. Após a morte de Bernanos, em discussão com Albert Béguin, executor literário de Bernanos, von le Fort concedeu permissão para a publicação em janeiro de 1949 e doou a sua fração das royalties, que lhe eram devidas enquanto autora, à viúva e aos filhos de Bernanos. Von le Fort solicitou que a obra de Bernanos recebesse um título diferente de sua própria novela, ao que Béguin optou por Dialogues des Carmélites, que viria a ser a base para a ópera de Francis Poulenc, de 1956.


Seus escritos lhe conferiram o título de "a maior poetisa transcendente contemporânea." Ela escreveu sobre sua novela: "O contexto histórico era meramente um traje para vestir um problema muito agudo." Ela foi nomeada por Hermann Hesse ao Prêmio Nobel de Literatura e agraciada com um Doutorado Honorário em Teologia, em reconhecimento às suas contribuições à questão teológica em suas obras.


No que diz respeito à sua produção literária, tanto os ensaios quanto os romances de Gertrud von le Fort perpassam a metafísica e, como seria de se esperar, a teologia mística. Uma autora verdadeiramente grandiosa, abertamente decidida a proporcionar reflexões profundas e a transformar até mesmo o medo em objeto de análise filosófica e teológica de grande profundidade.


O artigo da já citado afirma a esse respeito: "Le Fort colocou suas teorias de medo existencial cristão em diálogo com a imaginação literária católica."


E continua: "Gertrude von Le Fort foi a primeira autora a tratar dos aspectos psicológicos e metafísicos do medo em uma obra de ficção: o medo das criaturas indefesas, o medo de todas as criaturas, que é o medo da agonia de Cristo no Monte das Oliveiras. Aqueles que leram este livro nos anos trinta na Alemanha compreenderam claramente o seu significado."




Considerando que a temática do medo, pavor e pânico, bem como os avanços das ideias modernistas em relação ao feminino, crescem desenfreadamente, torna-se evidente a necessidade desta obra como uma fonte de reflexão profunda sobre a temática e, acima de tudo, sobre as respostas. Esta filósofa e teóloga católica não se contenta apenas em analisar o problema, mas também em trazer à luz a posição de resposta, ou seja, para onde devemos voltar nosso olhar e em que estado deve se manter nossa mente em relação a essas temáticas.

Esta estudiosa de notável capacidade nos favorece com uma visão clara das limitações em que a mente moderna se encontra. Aplicando-se à nossa época: inclusive os mais devotos trilham um caminho sem se desvencilharem das armadilhas escondidas nas ilusões que se apresentam sob diferentes disfarces. Por exemplo, a crença feminista na superioridade das mulheres sobre os homens é análoga à convicção de que as mulheres piedosas podem, sozinhas, elevar a sociedade. Ambas são ilusões que excluem o papel masculino de se responsabilizar e se tornar mais semelhante ao Senhor, livrando-se das limitações, preconceitos e clubismo, características maléficas realmente existentes por conta do pecado original. Ambas percepções atribuem uma supercapacidade às mulheres em detrimento dos homens e, acima de tudo, negligenciam a verdadeira complementaridade entre a ação feminina e masculina.

Essa complementaridade não reside em dividir tarefas estereotipadas — uma lavar a louça e o outro carpir, uma fazer bolo e o outro estudar — mas em cada um fazer tudo que sabe fazer, o homem como homem e a mulher como mulher. Estranhamente, parece muito complexo aplicar esta realidade. Passamos de ilusão em ilusão, ilusões excludentes que não fazem o homem e a mulher trabalharem juntos, mas, mesmo piedosamente, acreditarem infantilmente que podem fazer algo: os homens num clubismo masculino e as mulheres numa roda feminina. Dessa forma, todos permanecem confortavelmente numa falsa contra-revolução, que apenas preparará o terreno para uma nova revolução ideológica contrária.



A Universidade de Cambridge aponta sobre a autora: "A celebração do octogésimo quinto aniversário de Gertrud von le Fort, ocorrida em outubro passado em Oberstdorff, Baviera, passou praticamente sem comentários neste país. Embora o nome desta autora católica não seja desconhecido do público inglês — sua obra mais conhecida, Die Letzte am Schafott, foi a fonte de uma ópera de Poulenc apresentada no Covent Garden em 1958 e de um filme roteirizado por Georges Bernanos produzido em 1960 — é verdade que grande parte de seu trabalho permanece literalmente um livro fechado. Trata-se de um estado de coisas lamentável, uma vez que seus escritos abordam diversos temas tratados por figuras literárias amplamente celebradas internacionalmente, como Mauriac e nosso próprio Graham Greene.

De ascendência huguenote, Gertrud von le Fort nasceu em 1876 em Minden, Vestfália, e pode traçar uma rica história familiar que remonta aos tempos da Reforma. Três membros da família Le Fort lutaram como oficiais de Luís XVI nas Tulherias, enquanto o mais famoso de seus ancestrais, François le Fort, foi almirante e companheiro de Pedro, o Grande."







Como acontece com todos os trabalhos filosóficos que são expostos à luz, inevitavelmente são submetidos ao esquartejamento moderno, e com esta escritora alemã não é diferente. Na Alemanha, surgem linhas e grupos com o objetivo de desmantelar o texto e inserir interpretações contemporâneas, num esforço solenemente vergonhoso.

No entanto, todos os que escrevem ou falam em público estão cientes de que suas palavras podem ser descredibilizadas, pisoteadas, alteradas e "interpretadas". Por isso, é especialmente importante garantir a preservação mais pura de uma obra tão sublime, sem buscar imprimir nela os devaneios modernos de inexatidão.





Contexto Histórico: Política, economia e comportamento


Nos anos de 1930 e 1931, o mundo testemunhou eventos significativos que se destacaram tanto no cenário internacional quanto no contexto brasileiro.

Internacionais:

Em 1930, a Grande Depressão continuou a devastar as economias globais, resultando em elevadas taxas de desemprego e falências generalizadas. Na esfera cultural, a primeira Copa do Mundo de Futebol foi realizada no Uruguai, onde o país anfitrião obteve a vitória. A indústria cinematográfica lançou filmes notáveis que refletiam a tensão e as esperanças da sociedade em meio à crise econômica. Na ciência e tecnologia, ocorreram avanços substanciais, como o autogiro de Juan de la Cierva, precursor do helicóptero moderno.

Em 1931, a conjuntura internacional foi marcada por uma série de eventos políticos significativos. Na Espanha, a monarquia foi abolida e a Segunda República Espanhola foi proclamada em abril. Na esfera artística e cultural, "The Star-Spangled Banner" foi oficialmente adotado como hino nacional dos Estados Unidos em março, enquanto Luis Buñuel lançou "A Idade Dourada", uma obra-prima do cinema surrealista. Além disso, desastres naturais, como as inundações na China, causaram devastação e resultaram em inúmeras perdas.

Brasil:

No Brasil, em 1930, a Revolução de 1930 culminou na deposição do presidente Washington Luís em 24 de outubro, com Getúlio Vargas assumindo a presidência. Esse evento significou uma mudança radical no panorama político brasileiro.

Em 1931, o Brasil viveu um ano de "consolidação" sob a liderança de Getúlio Vargas, que continuou a implementar várias reformas políticas importantes. Além disso, a inauguração do Cristo Redentor no Rio de Janeiro, em 12 de outubro, foi um marco significativo do período.


Em 1930, Bertha Lutz, uma das principais líderes feministas do Brasil, estava ativamente engajada na luta pelos direitos das mulheres. Foi em 1932, pouco após este período, que as mulheres brasileiras conquistaram finalmente o direito de voto com a promulgação do Código Eleitoral. Os debates internos entre diferentes abordagens feministas também eram intensos. Algumas vertentes, influenciadas pelo Partido Comunista do Brasil, viam o feminismo como um movimento "pequeno-burguês" e inadequado para as reais necessidades das mulheres trabalhadoras, enfatizando a luta de classes como o verdadeiro caminho para a "emancipação feminina." Isso explica as características peculiares e regionais do feminismo brasileiro e por que, de certa forma, as ações antifeministas (mesmo as piedosas) tendem à atitude burguesa, pois esta foi colocada como antagônica histórica, não por ser boa, mas por ser capitalista. O que, para a resolução da questão sobre respeito genuíno, definitivamente não traz respostas.




Perceba que este estado de ânimo antecedeu à Segunda Guerra Mundial, que recebeu pessoas recém-saídas dos loucos anos 20 já citados (aqui: Literato Católico: Maria Luiza Chaveut e sua Teologia Educacional ) e embevecidas por mudanças políticas, econômicas e ideológicas.






Livros da Literatura do Século XX 



No modernismo, autores como James Joyce, com Ulysses (1922), e Marcel Proust, com À Sombra das Raparigas em Flor (1919), introduziram inovações como o fluxo de consciência. Na literatura existencialista, obras como O Estrangeiro (1942), de Albert Camus, e A Náusea (1938), de Jean-Paul Sartre, exploraram a liberdade e a alienação.


O realismo mágico emergiu com força na América Latina, com escritores como Gabriel García Márquez, autor de Cem Anos de Solidão (1967), e Juan Rulfo, com Pedro Páramo (1955), que mesclaram o cotidiano ao fantástico. No cenário pós-colonial, autores como Chinua Achebe, com O Mundo se Despedaça (1958), e Salman Rushdie, com Os Filhos da Meia-Noite (1981), abordaram a  independência cultural.


A poesia modernista também se destacou, com T.S. Eliot publicando A Terra Desolada (1922), uma obra repleta de alusões fragmentadas, enquanto Pablo Neruda publicava sua poesia romântica e política, como em Vinte Poemas de Amor e uma Canção Desesperada (1924). No teatro, Samuel Beckett desafiou as convenções com Esperando Godot (1953), representativo do Teatro do Absurdo, enquanto Federico García Lorca explorou as tensões sociais em peças como A Casa de Bernarda Alba (1936).


A literatura distópica também floresceu com obras como 1984 (1949), de George Orwell, que lançou uma poderosa crítica ao totalitarismo, e Admirável Mundo Novo (1932), de Aldous Huxley, que examinou os perigos de uma sociedade controlada. Simone de Beauvoir publicou O Segundo Sexo (1949), enquanto Virginia Woolf publicou Uma Janela para o Amor (1927).


No Brasil, Clarice Lispector se destacou como uma das maiores escritoras do século, trazendo uma linguagem introspectiva e poética em obras como sua obra A Paixão Segundo G.H. (1964) e A Hora da Estrela (1977). Por outro lado, autoras afro-americanas como Zora Neale Hurston, com Seus Olhos Viam Deus (1937), e Toni Morrison, ganhadora do Prêmio Nobel em 1993, trouxeram narrativas sobre a experiência afrodescendente, como em Amada (1987).


O mercado também abriu espaço para narrativas de suspense, como as de Agatha Christie, a "Rainha do Crime", cujas obras, como Assassinato no Expresso do Oriente (1934) e E Não Sobrou Nenhum (1939). 



Gertrud von Le Fort destacou-se com Hymnen an die Kirche (1924), um tributo à Igreja Católica, e Die Letzte am Schafott (1931), que narra o martírio das Carmelitas de Compiègne. Edith Stein, filósofa e santa católica, deixou importantes escritos como On the Problem of Empathy (1916) e The Science of the Cross. Maria Luiza Chaveut publicou o seu A virgem cristã na família e no mundo em 1930.


Na África, Margaret Ogola contribuiu com The River and the Source (1994), uma celebração de gerações de mulheres quenianas, além de I Swear by Apollo (2002) e Place of Destiny (2005). Flannery O'Connor, uma renomada escritora americana, trouxe contos e romances que abordam a graça divina e a complexidade humana, como em Wise Blood (1952). Alice Thomas Ellis explorou a fé e a moral em obras como The Sin Eater (1977), enquanto Caryl Houselander destacou-se por seus escritos espirituais, como The Reed of God (1944), que reflete sobre a Virgem Maria.


Ademais, Irmã Miriam Joseph, acadêmica e autora católica, deixou um importante legado com The Trivium: The Liberal Arts of Logic, Grammar, and Rhetoric (1937), uma obra que revitaliza as artes liberais na educação, e Shakespeare's Use of the Arts of Language (1947), que analisa o uso da retórica nas obras de Shakespeare. 





para apreciação






Ana Paula Barros

Especialista em Educação Clássica e Neuro Educação pela Pontifícia Universidade Católica. Graduada em Curadoria de Arte e Produção Cultural pela Academia de Belas Artes de São Paulo. Professora independente no Portal Educa-te (desde 2018). Editora-chefe da Revista Salutaris e autora dos livros: Modéstia (2018), Graça & Beleza (2025). 

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